terça-feira, 3 de julho de 2012

Bola na Lagoa- o dia em que vencemos o futebol e o remo do Flamengo. .

                                                      Ilustração: Flavio Pessoa, 2009.   

Em vista do centenário deste que é os mais místico e celebrado clássico do futebol brasileiro, se não, mundial, começamos aqui a publicar alguns posts relembrando algumas históricas decisões entre os "irmãos Karamazov" do futebol. Fla-Flu tem história, e evidente que num blog tricolor, vamos privilegiar as decisões que nos foram favoráveis, o que torna essa tarefa mais trabalhosa. Foram oito os grandes jogos decisivos, cujo resultado garantiria mais um troféu na nossa sala-museu que hoje inaugura. Se algum rubro-negro resolver fazer o mesmo exercício investigando as nossas derrotas, terá muito mais facilidade e levará menos tempo. Não passam de três, nesses 100 anos, as ocasiões em que perdemos uma decisão de um título expressivo para os nossos honrosos adversários. Devemos dizer que eles tem a grandeza de admitir essa freguesia nas horas decisivas, nos prestando homenagem em seu prórpio hino: "(...) e nos Fla-Flus é o ai, Jesus!"  Sábio Lamartine.
Provocações à parte, vamos ao episódio da Gávea. Flamengo e Fluminense decidiram o campeonato de 1941 no estádio rubro-negro, colado à Lagoa Rodrigo de Freitas, que acabou se tornando protagonista dessa nossa história. O Flu tinha a vantagem do empate para tentar o bi-campeonato. E quem nos ajuda a contar essa história é aquele que na minha modesta opinião é o mais ilustre torcedor rubro-negro de todos os tempos: Mário Filho, que por coincidência é irmão do igualmente mais ilustre  torcedor tricolor da história ( creio que aqui encontrarei menor controvérsia): Nelson Rodrigues.  Na crônnica sobre esta inesquecível peleja, Mário assume que não apenas o Fla-Flu era o clássico que ele mais gostava (como todos já podíamos imaginar), como também admite sua preferência por esse Fla-Flu da Lagoa. Curiosamente, ele aponta um clássico vencido pelo tricolor e aí está uma pequena mostra da grandeza deste grande rubro-negro que foi Mário Filho.Também devemos lembrar que Mário nos deixou antes de poder testemunhar todos os grandes confrontos de 66 pra cá. E a primeira peculiariedade que ele destaca no jogo diz muito sobre o caráter inusitado deste clássico:
" E o curioso é que desse match a gente só se recorda dos 6 minutos finais. Os gols todos já estavam feitos: dois a dois. Pois foi como se o  Fla-Flu começasse ali e durasse aopenas seis minutos, que não foram seis, que duraram a eternidade."
Mas vamos situar melhor o grau de dramaticidade desta partida. Flamengo e Fluminense vinham fzendo um  jogo equilibrado até que Pedro Amorim abriu o placar para o tricolor. Como o Flamengo sentiu o golpe, o Flu fez o segundo. Com dois a zero e a vantagem do empate, tudo isso na casa do adversário, o Flu recuou. O Flamengo diminuiu a vantagem já no segundo tempo e chegou ao empate quando, no relógio ou na lembrança de Mário Filho, faltavam seis minutos para se encerrar a partida (outros apontam que o gol de empate teria sido aos 40 ou 41 minutos).  Antes de retornar à Mário Filho, que conta o resto da história, anunciemos então, a entrada em cena da nossa querida Lagoa que batizou a decisão daquele ano.
" O Flamengo atacava, o  Flumienense jogava a bola na Lagoa. não se tratava do recurso da bola fora. Bola fora não diantava ao Fluimiense. Noutro campo, a história desse Fla-Flu seria diferente. Bola fora  volta lgo. na Lagoa, demorava. E o Flamengo  E o Flamengo jogou na água guarnições inteiras de remo para apanhar a bola na Lagoa. Parecia que essas guarnições disputavam um campeonato de remo. Apanhavam a bola mandavam de novo para o campo e ficavam nágua, os remos suspensos, os músculos retesados, prontos para quarenta remadas por minuto. Que outra bola havia de vir, e rápida. Enquanto o Fluminense pudesse jogar bolas na Lagoa não faria outra coisa."


Foto do time campeão: Em primeiro plano, Batatais. E, em seguida: Renganeschi, Pedro Amorim, Carreiro, Tim, Machado, Malazzo, Romeu Pelliciari, Russo, Brant, Afonsinho, e o técnico Ondino Viera.


"Era ainda no tempo do cronometrista. O juiz não mandava no tempo, quem mandava era o cronometrista. A bola caía na Lagoa. O cronometrista travava o cronômetro. E o tempo parava. O Flamengo queria que o tempo paraesse, o Fluminense que corresse.
O Flamengo mandou buscar todas as bolas que tinham. Eram bolas de treino, bolas pesadas, duras, enchidas ás pressas, estourando de ar. (...) Lembro-me que Batatais, uma vez, fez cera escolhendo uma entre as muitas bolas do Flamengo.Apertava uma, nõ servia, batia com outra no chão, não servia, como que pesava outra numa mão estendia feito prato de balança, não servia. Batatais escolhia uma bola, ajeitava para Raganeschi, Raganeschi enchia o pé, bola para Lagoa. 
(...)
Era o que ia dar o nome àquele Fla-Flu. Primeiro se disse que fora o 'Fla-Flu de bola na Lagoa'. Depois se sintetizou: 'Fla-Flu da Lagoa'. E dito 'Fla-Flu' e dita 'Lagoa', Já se sabia de que Fla-Flu se tratava."        


   Acho que vale a pena ressaltar dois detalhes no relato de Mário Filho. O primeiro está no fato do Flamengo colocar equipes do remo para ajudar uma conquista no futebol, promovendo uma força conjunta enquanto clube.  no início do século, isso seria impensável. O remo e a regata ocupavam uma posição "hierárquica" superior ao futebol, no rol da  preferência popular entre modalidades esportivas, e o crescimento do interesse da cidade pelo fuetbol certamente foi causa de desconfianças, "rivalidades", atritos e polêmicas. Segundo relatos do próprio Mário Filho, o Clube de Regatas do Flamengo teria aceitado a inclusão do futebol mais pra ver no que ia dar, do que por acreditar no potencial daquele novo esporte bretão. Se isso é mesmo verdade, o episódio, então, marca uma período histórico de valores já bastante mudados. Nos anos 40, o futebol já gozava de ampla popularidade e se não atraía ainda uma multidão de Maracanã é porque este ainda estava pra ser construído. Com a contribuição do próprio Mário Filho,aliás, mas esta é outra história. Outro detalhe é que, assim sendo, num episódio inusitado, dais quais não conheço precendentes na história do futebol, o Fluminense acabou vencendo o Flamengo do remo e do futebol ao mesmo tempo.

Ficha técnica: Flamengo 2 x 2 Fluminense.
Última rodada do Campeonato Carioca de 1941.
Data: 23/11/1941.
Local: Estádio da Gávea.
Flamengo: Yustrich; Domingos da Guia e Newton; Biguá, Volante e Jaime; Sá, Zizinho, Pirillo, Reuben e Vevé. Técnico: Flávio Costa.
Fluminense: Batatais; Renganeschi e Machado; Malazzo, Brant e Afonsinho; Pedro Amorim, Romeu, Russo, Tim e Carreiro. Técnico: Ondino Viera.
Gols: Pedro Amorim (20'), Russo (26') e Pirillo (36') no primeiro tempo; Pirillo (40') no segundo tempo.
Árbitro: José Ferreira Lemos, o "Juca da Praia".
Expulsão: Carreiro.
Público: 15.312 pagantes.
Renda: (réis) 115.943$300.
Fontes: 
FILHO, Mário. O Fla-Flu da Lagoa. in: MARON FILHO, Oscar e FERREIRA, Renato (org.). Fla-Flu...e as multidões despertaram! Rio de Janeiro: Ed. Europa, 1987, p. 78-80.

http://jornalheiros.blogspot.com.br/2009/10/recordar-e-viver-aqueles-quatro-minutos.html

    

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