Ilustração: Flavio Pessoa. Ano: 2009.
Longe de mim querer desmentir Nelson Rodrigues, mas o Fla-Flu começou 40 minutos antes do nada da mesma forma que ele já era tricolor desde vidas passadas, mesmo tendo nascido dez anos depois da fundação do clube. Mas a história deste primeiro Fla-Flu merece ser lembrada. Este mais famoso clássico do futebol brasileiro foi logo mostrando a que veio, desde o primeiro minuto do primeiro confrontro. Mas para tanto é preciso retroceder um pouco mais no tempo. Preliminares
Setembro de 1911. Assaf e Martins nos fazem voltar no tempo, ora vejam, o período de uma gestação, cerca de 9 meses, para relatar as origens do clássico que amanhã faz 100 anos. Disse do clássico, como poderia dizer do futebol do Flamengo, pois a partir daí seria possível que surgisse a disputa, o embate. Mas o caso é que o Fluminense iria jogar o penúltimo jogo do torneio de 11. Na época, como não havia a figura do técnico, quem escalava o time era uma comissão técnica. Alberto Borgerth, que compunha o committee e também era jogador chegou a sugerir que o time fosse consultado, mas Afonso de Castro foi contra, alegando o risco de abrir um precedente perigoso. Por causa de dois jogadores, Oswaldo Gomes e Ernesto paranhos, preferido pela comissão, contra Arnaldo Guimarães e o próprio Borgerth, preferidos pela maioria dos jogadores, com exceção óbvia dos dois primeiros escalados pela comissão. No dia 21 de setembro os jogadores insatisfeitos decidiram terminar os compromissos no campeonato, garantindo o título para o clube e depois abandoná-lo. A ideia dos jogadores era procurar um clube que já fosse estruturado mas que não tivesse ainda um departamento de futebol. É necessário dizer que aquele time do Fluminense campeão em 1911, que iria vestir a camisa rubro-negra no ano seguinte era arrasador. Seis jogos, seis vitórias. 21 gols a favor, apenas 1 contra.
Pois bem.Este time arrasador iria todo para o Flamengo, com exceção dos jogadores preferidos pela comissão técnica, que causaram a polêmica. E o primeiro confronto entre os dois, após a cisão, o novo futebol do Flamengo era favorito diante do time que mais vezes tinha sido campeão carioca, do mais antigo clube de futebol da cidade, que havia conquistado 5 dos 6 certames disputados. E não bastasse isso, este último parecia ser o mais devastador, ganhando todos os 6 jogos, com direito a 3 goleadas.
Mas o futebol do Flamengo não teve lá aquela receptividade esperada. Como clube de regatas, não havia campo para os treinos. Outra prova do descaso (ou desconfiança) do clube quanto ao futebol estava na camisa. O Flamengo entrou em campo com a camisa "papagaio-de-vintém". Não podiam usar o oficial, imaginem, do time de regatas.
Esta foto é o único registro visual da histórica partida.
O jogo.
O primeiro Fla-Flu da história não teve a assistência que merecia, nem a sombra da cobertura que os jornais de hj dão ao clássico. Este Fla-Flu ainda não era Fla-Flu. E não me refiro só à sigla (leia abaixo, a origem da abreviação). Ainda não estava marcado como um clássico. O futebol do Flamengo estava ainda-digamos- em fase de teste, só que jogando com um dos melhores times do campeonato. Já o Fluminense ficou desmantelado após a saída de nove jogadores titulares. Esperava-se uma vitória sem dificuldades do quadro rubro-negro. Talvez tenha sido justamente a surpresa que garantiu a sustentabilidade do clássico. Coisas de Fla-Flu.
Mas o Fluminense começou de cara abalando as convicções rubro-negras de superioridade com um gol de Edward Calvert na saída de bola. E o Flamengo empataria logo depois com Arnaldo Guimarães, um dos que estavam no centro da polêmica no ano anterior. No segundo tempo, James Calvert fez 2x1 para o tricolor. Restando dois minutos, Píndaro volta a empatar. Mas o primeiro de todos tinha que ser ainda mais surpreendente. Em jogada pessoal, Bartholomeu fez o terceiro no minuto final.
Curiosidade da silga.
O primeiro Fla-Flu que ainda não era Fla-Flu. A Sigla não seria criada por Mário Flho, como muitos pensam. No máximo, eternizada por ele. A sigla surgiu assim de forma pejorativa. Em 1925, a seleção carioca foi formada somente por jogadores dos dois times. Os torcedores dos times rivais que não se sentiam representados por aquele selecionado, passaram a usar a sigla para se referir àquela seleção que não passaria, então, de um combinado Fla-Flu. Em tempo: o combinado Fla-Flu acabou conquistando o título de brasileiro de seleções, muito popular na época.
Mário Filho sobre o primeiro Fla-Flu.
Os dois irmãos escreveram sobre a primeira partida, mas foi Mário que se dedicou mais a falar do jogo. Do jogo só, não. Dos pormenores, do português tratador do campo do Fluminense e do famoso burrico Faísca, que pisava de luvas no gramado (nas Laranjeiras, até o burro andava a rigor). Devemos lembrar que Mário Filho desde sempre se dedicou a escrever sobre esporte, a promover o esporte. Foi editor do Jornal dos Sports, escreveu livros antológicos sobre a história do futebol brasileiro. Como bom jornalista, carregava no caráter emocional das partidas, e muitas das histórias por ele relatadas não se pode pôr a mão no fogo. Não importa. São maravilhosas e merecem nosso apreço.
Do que Nelson Rodrigues fala, já tratamos aqui, no post que fala dos irmãos Karamazov do futebol. Mário Filho Relata o almoço dos jogadores, os preparativos para a partida, as reações da torcida. Coincidência alguma se veio à mente do leitor, as crônicas de hoje, principalmente as reportagens de TV. Súmula:
FLUMINENSE 3 X 2 FLAMENGO (1-1)
Competição: Campeonato Carioca – (primeiro turno)
Local: Laranjeiras
Juiz: Frank Robinson
Público: 800
Fluminense: Laport, Maia, Belo, Leal, Mutzembecker, Pernambuco, Osvaldo, Bartô, Behrmann, Edward Calvert e James Calvert.
Flamengo: Baena, Píndaro, Nery, Cintra, Gilberto, Galo, Orlando, Arnaldo, Borghert, Gustavo, Amarante.
Gols: Edward Calvert (1), Arnaldo (4), James Calvert (57), Píndaro (70), Barthô (72).
Competição: Campeonato Carioca – (primeiro turno)
Local: Laranjeiras
Juiz: Frank Robinson
Público: 800
Fluminense: Laport, Maia, Belo, Leal, Mutzembecker, Pernambuco, Osvaldo, Bartô, Behrmann, Edward Calvert e James Calvert.
Flamengo: Baena, Píndaro, Nery, Cintra, Gilberto, Galo, Orlando, Arnaldo, Borghert, Gustavo, Amarante.
Gols: Edward Calvert (1), Arnaldo (4), James Calvert (57), Píndaro (70), Barthô (72).
Referências consultadas:
ASSAF, Roberto e MARTINS, Clóvis. FLA X FLU: o jogo do século – Rio de Janeiro: Letras e Expressões, 1999.
RODRIGUES, Nelson e FILHO Mario. FLA-FLU… e as multidões despertaram. (org. Oscar Maron Filho e Renato Ferreira. Rio de Janeiro: Ed. Europa, 1987.
ASSAF, Roberto e MARTINS, Clóvis. FLA X FLU: o jogo do século – Rio de Janeiro: Letras e Expressões, 1999.
RODRIGUES, Nelson e FILHO Mario. FLA-FLU… e as multidões despertaram. (org. Oscar Maron Filho e Renato Ferreira. Rio de Janeiro: Ed. Europa, 1987.
http://historiadoesporte.wordpress.com/2010/09/15/origens-dos-classicos-iii-o-primeiro-fla-flu/
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