terça-feira, 31 de julho de 2012

As Tragédias Cariocas, ciclo de leituras em homenagem ao centenário de Nelson Rodrigues

Ilustração minha com design da Roberta de Freitas, 
este é meu trabalho mais recente, de julho de 2012. 

A partir da próxima segunda-feira, na Casa da Gávea começa o ciclo de leituras "As Tragédias Cariocas", quando serão lidas oito peças de Nelson Rodrigues (que faria 100 anos no dia 23 de agosto). Teremos sempre às 21h e sempre às segundas, a leitura de uma das peças teatrais escritas por Nelson, que compõe o que o crítico teatral Sábato Magaldi classificou  como "tragédias cariocas", onde ele entendeu que o autor  explorava o cenário carioca para conduzir suas tragédias.
Muito bem... o que o clico tem a ver com o blog cultura tricolor? Muito. Não apenas pela notória paixão de Nelson Rodrigues pelo Fluminense, mas porque suas peças, volta e meia, faziam menção ao futebol, de alguma forma. Na primeira peça que será "encenada", ou melhor dizendo...lida, na próxima segunda-feira, "A Falecida" tem no jogo entre Fluminense e Vasco, o pano de fundo para o desenrolar da peça, cujo principal protagonista é Tuninho, um fanático cruzmaltino que divide sua preocupação entre seu desempergo, a obsessão fúnebre da mulher e o grande clássico do fim de semana.

Não teremos espaço em todo o conjunto das peças gráficas do evento, para ilustrar cada uma das 8 peças que serão lidas na Casa da Gávea, o que nos levou (minha companheira Roberta de Freitas cuidou do projeto gráfico, enquanto me coube as ilustrações) a buscar uma alternativa mais econômica, onde procurei ilustrar o "universo rodrigueano" de uma forma geral. A homenagem que faço ao futebol, no caso, é o Jornal dos Sports que surge nas mãos de um transeunte paquerado por uma colegial... Notem na primeira página, que a manchete faz nova homenagem ao Nelson e ao nosso querido Fluzão... 

    

Companheiros de luta e de glórias, sou tricolor de coração

 
Ilustração minha de 2009.   
 
Como é o hino do Fluminense? Qualquer criança há de responder sem titubear, cantando os versos da famosa marchinha de Lamartine Babo: "Sou tricolor de coração, sou do clube tantas vezes campeão..." Marchinha composta nos idos da década de 1940.
Mas peraí... se o Fluminense foi fundado em 1902 e o hino cantado até hoje nas arquibancadas é da década de '40, qual era o hino do clube, antes da marchinha de Lamartine?

Primeiro Hino Oficial
Para voltar as histórias dos hinos, devemos lembrar do famoso escritor Paulo Coelho Netto, que segundo o artigo de Manel J. G. Tubino, Bruno Castro de Sousa e Rafael Valladão, teria sido o grande incentivador da vida artística do Fluminense, tendo ocupado ainda o cargo de vice-presidnete do clube. Foi também o pai de João Coelho Neto, o célebre Preguinho, multi-atleta que muito honrou a camisa tricolor em vários esportes, além do futebol, o notório importal era um dos grandes defensores do futebol, tendo travado alguns embates intelectuais com Lima Barreto a esse respeito. O já "tricolor de coração" Coelho Neto também dedicou ao nosso Fluminense o primeiro livro sobre a história do clube, lançado por ocasião do cinquentenário do clube, em 1952. Coelho Neto também protagonizara um episódio que ficaria para a história do futebol (ou para o museu de lendas do velho esporte bretão): a dita "primeira" invasão de campo, quando indignado com a atuação do juiz que insistia em inventar pênaltis e a mandar voltar a cobrança até que o adversário fizeesse o gol, num Fla-Flu que acabou anulado.

Capa da edição de 1952, do livro de Coelho Netto.
No destaque da capa, a Taça Olímpica de 1949, prêmio-homenagem concedido pelo C.O.I. para o clube que mais se destacar em todo o mundo, na organização e promoção dos esportes olímpicos. O Fluminense é o único clube da América Latina a ter merecido a honraria.   

Mas voltando à história do hino, foi dele a autoria do primeiro hino oficial do clube. Segundo o mesmo artigo citado acima, Coelho Neto teria escrito a letra sobre música já existente de  H. Williams, It1s a long long way to Tipperary" - canção popular entre os soldados britânicos durante a Primeira Guerra Mundial - para o hino que foi cantado pela primeira vez, na inauguração da 3ª sede, em 23 de julho (dois dias após o 13º aniversário de fundação do clube) de 1915.  Não é estranho que Coelho Neto tenha buscado inspiração numa canção entoada por soldados no primeiro grande conflito mundial. Os autores do artigo citam o caráter bélico, bem como valores em voga entre a elite carioca. Vale notar o vocabulário rebuscado, ao gosto da época, e a inspiração no discurso higienista em voga entre a elite nacional, que enaltecia o esporte como símbolo de modernidade e civilidade e que acreditava numa suposta supremacia genética: "Assim nas justas se congraça/ Em torno dum ideal viril/
A gente moça, a nova raça/ Do nosso Brasil !"     

O Fluminense é um crisol
Onde apuramos a energia
Ao pleno ar, ao claro sol
Lutando em justas de alegria
O nosso esforço se congraça
Em torno do ideal viril
De avigorar a nova raça
Do nosso Brasil !

Corrige o corpo como artista
Vida imprime à estátua augusta
Faz da argila uma robusta
Peça de aço onde a alma assista
Na arena como na vida
Do forte é sempre a vitória
Do estádio foi que a Grécia acometida
Irrompeu para a glória

Ninguém no clube se pertence
A glória aqui não é pessoal
Quem vence em campo é o Fluminense
Que é, como a Pátria, um ser ideal
Assim nas justas se congraça
Em torno dum ideal viril
A gente moça, a nova raça
Do nosso Brasil !

Adestra a força e doma o impulso
Triunfa, mas sem alardo
O herói é bravo mas galhardo
Tão forte d'alma que de pulso
A força esplende em saúde
E abre o peito à bondade
A força é a expressão viva da virtude
E garbo da mocidade      

Segundo Hino Oficial 
Como o primeiro hino começava a ser motivo de paródias, rapidamente foi encomendado novo hino. Na perspectiva melódica, uma marcha marcial, de inspiração bélica, também ressaltavam aspectos e valores da aristocráticos, enaltecendo o esporte como símbolo de costumes civilizados espelhados no modelo europeu. De autoria de Antônio Cardoso de Menezes Filho, o segundo hino  também sugerem a noção da crença excludente na raça superior: "Disputamos no campo a vitória/ Do mais forte, mais destro e sagaz!"
Nota-se que os hinos foram compostos por famílias tradicionais que perteciam à nata da sociedade carioca. 

Companheiros de luta e de glória
Na peleja incruenta e de paz
Disputamos no campo a vitória
Do mais forte, mais destro e sagaz!

Nossas liças de atletas são mansas
Como as querem os tempos de agora
Ressuscitam heróicas lembranças
Dos olímpicos jogos de outrora

Não nos cega o furor da batalha
Nem nos fere o rival, se é mais forte!
Nossas bolas são nossa metralha
Um bom goal, nosso tiro de morte

Fluminense, avante, ao combate
Nosso nome cerquemos de glória
Já se ouve tocar a rebate
Disputemos no campo a vitória.

A marchinha de Lamartine
 Das marchas marciais às carnavalescas, a popularização dos hinos dos clubes cariocas tem a ver com uma mudança radical do futebol no cenário cultural brasileiro. A popularização do esporte através da imprensa, das transmissões à rádio, já tirara da prática todo o caráter elitista, que clubes como Fluminense se preocupavam em manter até, pelo menos, a profissionalização na década de '30. Entra em cena, Lamartine Babo, um dos maiores nomes do carnaval carioca, autor de pérolas como "Teu cabelo não nega", "Linda Morena" entre outras tantas célebres marchinhas carnavalescas, é representativo dessa gradual transformação.Os novos hinos dos clubes cariocas foram todos compostos por Lamartine na década de 40.  Como afirmaram Tubino, Souza e Valladão, perde-se o garbo, a pompa, a solenidade, ganha-se em alegria, empolgação, popularização, onde o vocabulário mais coloquial ajuda bastante no processo. Algo semelhante já acontecia na imprensa com intensidade desde a década de '30, em que a linguagem direta e fácil do Jornal dos Sports, se torna o exemplo mais representativo. Os hinos (ou marchinhas) de Lamartine exprimem bem este momento. O artigo já citado, percebe que, por mais que tenha perdido muito da carga higienista, a marchinha de Lamartine ainda mantinha o tom nobre a cavalheiresco: " Fascina pela sua disciplina" ou ainda " Vence o Fluminense usando as fidalguias"... 
 Segundo seu biógrafo, diz o artigo, Lamartine escreveu a letra do hino do Fluminense, sobre música do maestro Lyrio Pannicalli, na antiga sorveteria Americana,  depois ocupada pela garagem do Hotel Serrador, prédio hoje adquirido pela Petrobrás, no Rio de Janeiro.  A primeira parte ressalta a fiorte relação entre torcedor e o clube e seus símbolos, como a bandeira ("Salve o querido pavilhão"), enquanto a segunda parte do hino atribui sentido às cores do clube, reforçando um forte vínculo identitário. 

Sou tricolor de coração
Sou do clube tantas vezes campeão
Fascina pela sua disciplina
O Fluminense me domina
Eu tenho amor ao tricolor

Salve o querido pavilhão
Das três cores que traduzem tradição
A paz, a esperança e o vigor
Unido e forte pelo esporte
Eu sou é tricolor

Vence o Fluminense
Com o verde da esperança
Pois quem espera sempre alcança
Clube que orgulha o Brasil
Retumbante de glórias
E vitórias mil

Vence o Fluminense
Com o sangue do encarnado
Com amor e com vigor
Faz a torcida querida
Vibrar de emoção o tri-campeão

Vence o Fluminense
Usando a fidalguia
Branco é paz e harmonia
Brilha com o sol
Da manhã
Qual luz de um refletor
Salve o Tricolor
 
No Vagalume, a melodia do segundo hino oficial.
http://www.vagalume.com.br/hinos-de-futebol/fluminense-oficial.html

No youtube, várias versões do hino popular:

http://www.youtube.com/results?search_query=Hino+do+Fluminense&oq=Hino+do+Fluminense&gs_l=youtube.3..35i39j0l9.749.6294.0.6601.14.14.0.0.0.0.1009.2689.2j3j2j5-1j0j1.9.0...0.0...1ac.Xl2fjW4moaY

Fontes: artigo TUBINO, Manuel José Gomes; SOUZA, Bruno Castro e VALLADÃO, Rafael. " Uma análise acerca do conteúdo dos hinos oficiais e populares dos principais clubes cariocas de futebol da primeira república ao Estado Novo."  http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/751/75117016010.pdf


(http://www.campeoesdofutebol.com.br/fluminense_hino.html)

terça-feira, 24 de julho de 2012

Torcida nas Laranjeiras na década de 1920

A torcida tricolor nas Laranjeiras, na década de 1920. 
Abaixo, a foto que inspirou a ilustração acima. 


Duas moças se destacam no meio de um público de futebol, onde o predomínio masculino ainda maior que o de hoje. Na frente, elas parecem mais sorridentes que seus companheiros de arquibancada. Na ilustração procurei destacar ainda mais as moças, combinando seus vestidos nas cores predominantes
da camisa tricolor. 

Nelson, nosso torcedor mais ilustre.

Inspirada em foto clássica de Nelson Rodrigues.

Nelson é um dos nomes mais lembrados no blog cultura tricolor justamente por acreditarmos que ele resume e representa como mais ninguém , a cultura tricolor. O genial escritor, dramaturgo e jornalista comparava, em suas crônicas esportivas,  as emoções do futebol a uma epopeia de um Homero, ou usava romances de Dostoiésvky ou Victor Hugo como referência ou metáfora para histórias da pelota. E o fazia com a mesma naturalidade e humor com que falava em Chacrinha, em chika-bon, com que bebia na cultura popular. Nelson é sem dúvida o nosso trovador maior. Todos as outras torcidas invejam até a raiz do cabelo o nosso Nelson Rodrigues.   


segunda-feira, 23 de julho de 2012

"Nasce o Fluminense"...a perspectiva romântica de Mário Filho

Legenda: 
Texto do Mário Filho, na fonte Courier. Do blog, na Trebuchet.

" Football ? Que vinha a ser "aquilo"? Oscar Cox tentava explicar. Havia um campo. Sim. O ouvinte abria os olhos, procurando ver o campo. Não era difícil imaginar o field. O Clube Brasileiro de Cricket tinha um. A coisa porém, se complicava quando Oscar Cox, balançando a cabeça, dizia que, fora o verde da grama, não existia semelhança alguma entre o campo de cricket e o campo de futebol. O campo de cricket sendo oval, o de futebol, retangular. "Então, dizia o outro, deixando de ver o field do Clube Brasileiro- então eu  não percebo nada". Mário Filho


  
Os fundadores do Fluminense, provavelmente após 1904, 
já com terno tricolor. O primeiro era cinza e branco. 


Mais uma vez fica difícil comprovar até que ponto havia algum exagero no relato de Mário Filho, respaldado apenas pelas lembranças de poucas testemunhas, recortes de jornal de Marcos Carneiro de Mendonça e outros. É também completamente possível que parte da alta aristocracia que, assim como Cox, já tivesse travado contato com o futebol, em viagens à Europa. Também é possível que Mário Filho ignorasse vestígios encontrados posteriormente, que revelem evidências da prática desde fins do século XIX. Longe de  mim querer desvalorizar a deliciosa prosa de Mário Filho,  cujo esforço hercúleo de recontar nuances da história do futebol  já serviu de base como fonte histórica fidedigna. Ao contrário, seu relato ganha mais valor, se percebermos nele mesmo, um vestígio da influência da imprensa na construção da história do futebol. Como extraordinário jornalista que era, interessava-lhe menos a segura veracidade dos relatos, do que, neste caso por exemplo, do caráter dramático e/ou romântico do mito do fundador, do pioneiro, ainda que a História, enquanto ciência se esforce em questionar. Se este herói fundador tiver vencido obstáculos, dificuldades, melhor ainda. O personagem preferido da imprensa: um Hércules e seus 12 trabalhos. O povo gosta de histórias de heróis, que venceram dificuldades e o esporte é um terreno fértil deles. Na crônica de Mário Filho, ele procura reproduzir o irrepetível: o fato ocorrido, com a maior riqueza de detalhes, e ao mesmo tempo, numa linguagem direta, coloquial, aberta ao grande público.  Então, reproduz com a minúcia dos precisos diálogos, Oscar Cox apresentando o futebol a seus amigos. Ao Rio de Janeiro, ou pelo menos, para a alta aristocracia carioca. Vamos à batalha de Cox... 


Football, um novo esporte sem graça?
"Oscar Cox tinha dezessete anos, e acabara de chegar da Suiça. Lá em Lausanne, ele jogava football   pelo Colégio de La Ville. hegando aqui, uma das primeiras coisas que ele queria saber foi"onde se pode jogar football?". Nunca lhe passara pela cabeça que o nome de um "esporte tão conhecido" soasse aos ouvintes de todo mundo- o todo mundo da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro de 97- como um termo misterioso. Quase indecifrável. Quem sabe se mandando buscar uma bola...a ideia encantou Oscar Cox. 

Ele encomendou uma bola Mac Gregor, número seis."

" A bola, porém, não resolvia tudo. Faltava um campo. Faltavam as balizas. Faltavam as redes. Faltavam, os jogadores. E Oscar Cox começou a sentir-se isolado. Mais isolado do que nunca. E agora a impressão que ele experimentava era de fracasso. Às vezes apareciam curiosos. Depois de uns dois chutes, todos paravam, desanimados, achando que o football não tinha nada de engraçado. "Quer saber de uma coisa, Oscar? Desista disso. O football é pau. Cacete como ele só. Não pega.ou você acha que é interessante a gente ficar aqui feito bobo vendo você jogar?" Oscar Cox acabou concordando. Agarrou a bola e levou-a para casa." 



Ilustração de 2009.
Incentivos do pai esportista.
"Como porém, deixar de pensar em football? O velho Emmanuel Cox (...) era o primeiro a animar o filho. Com um exeplo constante de entusiasmo pelo esporte. Fora ele, o velho Jorge Cox, quem tivera a ideia de fundar o Rio Cricket and Atlhetic Association. Parecia impossível, eis a conclusão que chegara Jorge Cox - que não houvesse um clube em Niterói com tanto inglês por perto." Em toda parte do mundo, uma dúzia de ingleses juntos formam um clube. Assim, nasceu em Niterói, o Rio Cricket. E com o Rio Cricket surgia também um campo."
" 'Arranje um team - foi o conselho do velho Jorge Cox a Oscar- e o resto será fácil.' Oscar Cox levou três anos de 98 ao ano primeiro do século XXI, para arranjar um team de football. Só de brasileiros. 
Quem vinha da Europa (...) vinha sabendo um pouco de football. Assim, se foi juntando gente (...)."
O team de brasileiros devia enfrentar um team de ingleses. Qual inglês que não dera um chute numa bola? E aí - era agosto de 1 - bem de manhã cedo, os tenistas do Rio Cricket and Athletic Association tiveram a atenção despertada por umas balizas colocadas nos extremos dos campos de cricket. Eles perguntaram ainda o que era aquilo quando apareceram os jogadores."
Sobre este jogo, a imprensa chegou a se envolver diretamente, referindo-se ao jogo como um Brasil x Inglaterra e aos brasileiros como "nós".  
Enquanto o velho Etchegaray explicava as regras aos tenistas, a bola rolava e Mário Filho vai relatando nuances do confronto. "Uma bola chutada por Caiwood Robinson não fora defendida por Clyto Portela. 'Foi goal - explicou o velho Etchegaray - Goal dos ingleses.' E quando Júlio de Moraes empatou, os tenistas do Rio Cricket compreenderam logo que tinha sido goal também." 





Ao empate com os ingleses, seguiram novos empates com os paulistas, nos primórdios do "Rio-São Paulo".        
  "Que faltava mais? Não bastava jogar aqui e ali, partidas de football. Era preciso mais alguma coisa. Um clube. A ideia do Fluminense (com o nome de Rio Football Club ainda)começava a perturbar as vigílias de Oscar Cox. E ele, um dia, surpreende os amigos com um convite. Quem estivesse de acordo com a fundação de um clube brasileiro de football, deveria comparecer, a hora tal, em tal lugar. E lá compareceu um grupo que se fez de engraçadinho. Oscar Cox deu início à sessão, em tom solene, declarando que, "como todos ali se achavam presentes estavam de acordo com a proposta apresentada"...E uma voz se fez ouvir: "Quem foi que disse que eu estava de acordo? Eu sou contra". O Fluminense teria que esperar, por causa disso, outra oportunidade para nascer."

Curioso destacar aqui a interpretação de Mário Filho, que chega a apresentar os diálogos com precisão de detalhes, atribui apenas a uma gracinha juvenil, a contrariedade de um descontente, sem apurar quem teria sido, quais os seus motivos e muito menos as razões que levavam a sua negativa ter um peso tamanho que inviabilizasse a tão desejada fundação do clube. Mas o episódio, apenas corriqueiro, é usado para reforçar a perseverança de Cox diante das dificuldades. Mas eis que se cumpriria o último obstáculo e no dia 21 de julho de 1902, "os portões da casa de Horácio Costa Santos, que ficava ali na Rua Marquês de Abrantes nº 51, se abriram para a cerimônia de fundação do Fluminense. Lá estavam Horácio Costa Santos, Mario Rocha, Walter Schuback, Felix Frias, Mario Frias, Moutinho, Luiz da Nóbrega Junior, Arthur Gibbons, Virgílio Leite de Oliveira e Silva, Manoel Rios, Américo da Silva Couto, Eurico de Moraes,A. C. Mascarenhas,Alvaro D. Costa, Julio de Moares, A.A. Roberts. E Manoel Rios presidiu a mesa, ladeado por Américo Couto e Oscar Cox. Oscar Cox estava com as mãos frias, de nervoso, e sentia um nó na garganta. Mas era de alegria: o Fluminense deixava de ser um sonho."   
           

domingo, 22 de julho de 2012

Tantas vezes campeão

Nossa sala de troféus...

 
Campeonatos Estaduais - 31
1906, 1907, 1908, 1909, 1911, 1917, 1918, 1919, 1924, 1936, 1937, 1938, 1940, 1941, 1946, 1951, 1959, 1964, 1969, 1971, 1973,1975,1976,1980, 1983, 1984, 1985, 1995, 2002, 2005, 2012 

Taça Guanabara - 09
1966, 1969, 1971, 1975, 1983, 1985, 1991, 1993, 2012.

Taça Rio - 02
1990, 2005.

Torneio Início - 06
1940, 1941, 1943, 1954, 1956, 1965

Torneio Municipal - 02
1938, 1948


Torneio Rio-São Paulo - 02
1960, 1967


Copa Rio Mundialito de clubes - 01
1952

Taça Olímpica - 01
1949

Campeonato Brasileiro - 03
1970, 1984, 2010

Torneios de Paris - 01
 1976, 1984


Taça Tereza Herrera - 01
1977 


Taça São Paulo de Juniores - 05
1971, 1973, 1977, 1986, 1989

sábado, 21 de julho de 2012

110 anos com amor e com vigor

Há exatos 110 anos, no dia 21 de julho de 1902, um grupo de fidalgos esportistas liderados por Oscar Cox, se reunia na casa de Horácio Costa, à Rua Marquês de Abrantes nº 51, para fundar o que seria o primeiro clube de futebol da então Capital do Brasil. Era a época em que o espírito esportivo se tornava um dos símbolos de modernidade e civilidade que a elite carioca buscava agregar à cidade de São Sebastião. Pereira Passos começava o seu "bota-abaixo" e, em três anos, abriria a Avenida Rio Branco, marco de uma ampla reforma urbana no Rio de Janeiro. Ideais esportivos já haviam sendo incutidos na população e lembrados em discursos como o de Rui Barbosa, como valores positivos a serem almejados por uma nação forte e sadia: mens sana e corpore sano. 

O jovem Oscar Cox, filho de Edward Cox, aristocrata inglês residente no Rio de Janeiro- igualmente envolvido com o mundo esportivo, havia fundado anos antes, o Rio Cricket Club, em Niterói - voltara um ano antes de seus estudos na Suiça (Hábito comum entre a alta aristocracia brasileira) disposto a continuar jogando o bom e velho esporte bretão que aprendera no Colégio La Ville, em Lausane. Não que nunca tivesse se jogado futebol no Rio de janeiro antes de Oscar Cox, pois já se encontrou indícios da prática ainda na última década do século anterior. Mas a fundação do Fluminense marcaria uma mudança, um começo de organização em torno do esporte. Dali, surgiriam novos clubes, ligas e o campeonato carioca,  a partir de 1906.
Mário Filho, na crônica "Nasce o Fluminense", fala em detalhes, de quando o jovem Oscar mandou buscar todo o equipamento necessário da Europa, e procurou apresentar aos amigos aquela novidade chamada football. No ano anterior, o primeiro do século, este grupo marcou uma partida contra o São Paulo Atlhetic (que nada tinha a ver com o tradicional São Paulo F.C). Dois empates (2 a 2 e 0 a 0) contra os paulistanos podem ser considerados um ótimo começo, visto que o futebol já estava bem mais evoluído e estruturtado em São Paulo.
Os bons resultados certamente motivaram o grupo a fundar o Rio Football Club. Isso mesmo, este seria o nome inicial do Fluminense, se  já não tivesse sido registrado,  resultando no  Rio Football Club. Nos amistosos marcados com os paulistanos, a imprensa local referia-se aos jogadores do Rio como a equipe dos rapazes fluminenses. Buscando origens no vocábulo latino "flumen", que significa "relativa ao Rio", o Fluminense significa clube do Rio.
E, após algumas tentativas frustradas, Oscar Cox conseguiu o consenso necessário para a fundação do clube. Nascia o Fluminense. Pois a primeira partida oficial do Fluminense seria em 19 de outubro de 1902, contra o clube que havia nos levado o primeiro nome. A resposta veio em campo, e o Fluminense começou com o pé direito, com uma sonora goleada: 8 a 0, com direito a 3 gols de Horácio Costa, o anfitrião da fundação do clube .

Súmula do primeiro jogo. 
Fluminense 8 x 0 Rio Football
Data: 19 de outubro de 1902.
Estádio: Campo do Payssandú Cricket.
Juiz: Louis Nóbrega Júnior.

Fluminense: Américo Couto; Mário Frias e Victor Etchegaray, Mário Rocha, Oscar Cox e Walter Schuback; Adolpho Simonsen, Eurico de Moraes, Horácio Costa, Heráclito Vasconcelos e Félix Frias.

Rio Football: R. Belfort;  T. Mackintosh e H. Palm, B. Lokhost, Alvarenga Senior e D. Croik, T. Pereira. Alvarenga Júnior,. H. Brenton, J. Stweart e A. Cerqueira.

Gols: Horácio costa (3), Heráclito Vasconcelos (2), Félix Frias, Eurico de Moraes e Adolpho Simonsen.


De Botafogo à Laranjeiras
 A primeira idéia de Cox era construir uma sede. Como a tentativa de alugar o terreno na Rua Dona Mariana, em Botafogo, o destino acabou levando a sede para o terreno nas esquians do Rua Guanabara e Roso. Inicialmente alugado ao Banco da República, Eduardo Guinle acabou adquirindo o terreno em 1904 e mandou construir a arquibancada.    
Em 1919, a  recém criada CBD solicitou a ajuda do Fluminense para abrigar a seleção brasileira quando o Brasil iria sedear o campeonato  sul-americano de futebol, que viria a ser a pimeira conquista da seleção brasileira. O Fluminense, então, conseguiu um empréstimo junto ao Banco do Brasil e construi um estádio para capacidade de 18 mil pessoas, o maior na época.

Ilustração: Flavio Pessoa, 2009. "Nasce" o Fluminense. 

A atual sede na década de 1920.

O time do Fluminense ainda com o primeiro uniforme

História do uniforme tricolor.
A alta sociedade carioca que se dedicava às práticas esportivas cultivava o esporte como um símbolo de civilidade, e um hábito aristocrata. Para manter a diferenciação, importavam todo o material. Reza a lenda, que o atual uniforme tricolor foi escolhido por acaso, quando um grupo de dirigentes em viagem à Inglaterra para comprar o tecido para o uniforme, mas não encontrou o conza e branco (segundo Hilário Franco Júnior, autor de a dança dos deuses, obra de sociologia sobre o esporte bretão, os uniformes dessa época eram muito sem cor, onde as cores "neutras" como cinza, preto e branco predominavam.
Mas os dirigentes encontraram no uniforme tricolor uma boa oportunidade de mudança e escreveram aos demais dirigentes no Rio, sugerindo a mudança. No primeiro campeonato carioca, em 1906, primeiuro troféu do clube, o Fluminense já era tricolor.   

Réplica do primeiro uniforme do Fluminense.

terça-feira, 17 de julho de 2012

Doces Milagres parte 01

Por enquanto, encaminho, depois de um longo inverno... parte da primeira diagramação
de 
"Doces Milagres", história em quadrinhos livremente inspirada no relato
do amigo tricolor, Flavio Henrique de Medeiros.
Em breve acrescentarei a parte referente à final de 95, continuação da história...  





sexta-feira, 6 de julho de 2012

100 anos esta tarde. O primeiro Fla-Flu!

                                            
Ilustração: Flavio Pessoa. Ano: 2009.
Longe de mim querer desmentir Nelson Rodrigues, mas o Fla-Flu começou 40 minutos antes do nada da mesma forma que ele já era tricolor desde vidas passadas, mesmo tendo nascido dez anos depois da fundação do clube. Mas a história deste primeiro Fla-Flu merece ser lembrada. Este mais famoso clássico do futebol brasileiro foi logo mostrando a que veio, desde o primeiro minuto do primeiro confrontro. Mas para tanto é preciso retroceder um pouco mais no tempo.  

Preliminares
Setembro de 1911. Assaf e Martins nos fazem voltar no tempo, ora vejam, o período de uma gestação, cerca de 9 meses, para relatar as origens do clássico que amanhã faz 100 anos. Disse do clássico, como poderia dizer do futebol do Flamengo, pois  a partir daí seria possível que surgisse a disputa, o embate. Mas o caso é que o Fluminense iria jogar o penúltimo jogo do torneio de 11. Na época, como não havia a figura do técnico, quem escalava o time era uma comissão técnica. Alberto Borgerth, que compunha o committee e também era jogador chegou a sugerir que o time fosse consultado, mas Afonso de Castro foi contra, alegando o risco de abrir um precedente perigoso. Por causa de dois jogadores, Oswaldo Gomes e Ernesto paranhos, preferido pela comissão, contra Arnaldo Guimarães e o próprio Borgerth, preferidos pela maioria dos jogadores, com exceção óbvia dos dois primeiros escalados pela comissão. No dia 21 de setembro os jogadores insatisfeitos decidiram terminar os compromissos no campeonato, garantindo o título para o clube e depois abandoná-lo. A ideia dos jogadores era procurar um clube que já fosse estruturado mas que não tivesse ainda um departamento de futebol.   É necessário dizer que aquele time do Fluminense campeão em 1911, que iria vestir a camisa rubro-negra no ano seguinte era arrasador. Seis jogos, seis vitórias. 21 gols a favor, apenas 1 contra.
Pois bem.Este time arrasador iria todo para o Flamengo, com exceção dos jogadores preferidos pela comissão técnica, que causaram a polêmica. E o primeiro confronto entre os dois, após a cisão, o novo futebol do Flamengo era favorito diante do time que mais vezes tinha sido campeão carioca, do mais antigo clube de futebol da cidade, que havia conquistado 5 dos 6 certames disputados. E não bastasse isso, este último parecia ser o mais devastador, ganhando todos os 6 jogos, com direito a 3 goleadas. 
Mas o futebol do Flamengo não  teve lá aquela receptividade esperada. Como clube de regatas, não havia campo para os treinos. Outra prova do descaso (ou desconfiança) do clube quanto ao futebol estava na camisa. O Flamengo entrou em campo com a camisa "papagaio-de-vintém". Não podiam usar o oficial, imaginem, do time de regatas.  


Esta foto é o único registro visual da histórica partida. 

O jogo. 
O primeiro Fla-Flu da história não teve a assistência que merecia, nem a sombra da cobertura que os jornais de hj dão ao clássico. Este Fla-Flu ainda não era Fla-Flu. E não me refiro só à sigla (leia abaixo, a origem da abreviação). Ainda não estava marcado como um clássico. O futebol do Flamengo estava ainda-digamos- em fase de teste, só que jogando com um dos melhores times do campeonato. Já o Fluminense ficou desmantelado após a saída de nove jogadores titulares.  Esperava-se uma vitória sem dificuldades do quadro rubro-negro. Talvez tenha sido justamente a surpresa que garantiu a sustentabilidade do clássico. Coisas de Fla-Flu.    
Mas o Fluminense começou de cara abalando as convicções rubro-negras de superioridade com um gol de Edward Calvert na saída de bola. E o Flamengo empataria logo depois com Arnaldo Guimarães, um dos que estavam no centro da polêmica no ano anterior. No segundo tempo, James Calvert fez 2x1 para o tricolor. Restando dois minutos, Píndaro volta a empatar. Mas o primeiro de todos tinha que ser ainda mais surpreendente. Em jogada pessoal, Bartholomeu fez o terceiro no minuto final.
     

Curiosidade da silga.
O primeiro Fla-Flu que ainda não era Fla-Flu. A Sigla não seria criada por Mário Flho, como muitos pensam. No máximo, eternizada por ele. A sigla surgiu assim de forma pejorativa.  Em 1925, a seleção carioca foi formada somente por jogadores dos dois times.  Os torcedores dos times rivais que não se sentiam representados por aquele selecionado, passaram a usar a sigla para se referir àquela seleção que não passaria, então, de um combinado Fla-Flu. Em tempo: o combinado Fla-Flu acabou conquistando o título de brasileiro de seleções, muito popular na época. 


Mário Filho sobre o primeiro Fla-Flu.
Os dois irmãos escreveram sobre a primeira partida, mas foi Mário que se dedicou mais a falar do jogo. Do jogo só, não. Dos pormenores, do português tratador do campo do Fluminense e do famoso burrico Faísca, que pisava de luvas no gramado (nas Laranjeiras, até o burro andava a rigor). Devemos lembrar que Mário Filho desde sempre se dedicou a escrever sobre esporte, a promover o esporte. Foi editor do Jornal dos Sports, escreveu livros antológicos sobre a história do futebol brasileiro. Como bom jornalista, carregava no caráter emocional das partidas, e muitas das histórias por ele relatadas não se pode pôr a mão no fogo. Não importa. São maravilhosas e merecem nosso apreço.     
Do que Nelson Rodrigues fala, já tratamos aqui, no post que fala dos irmãos Karamazov do futebol. Mário Filho Relata o almoço dos jogadores, os preparativos para a partida, as reações da torcida. Coincidência alguma se veio à mente do leitor, as crônicas de hoje, principalmente as reportagens de TV.

Súmula:

FLUMINENSE 3 X 2 FLAMENGO (1-1)
Competição: Campeonato Carioca – (primeiro turno)
Local: Laranjeiras
Juiz: Frank Robinson
Público: 800
Fluminense: Laport, Maia, Belo, Leal, Mutzembecker, Pernambuco, Osvaldo, Bartô, Behrmann, Edward Calvert e James Calvert.
Flamengo: Baena, Píndaro, Nery, Cintra, Gilberto, Galo, Orlando, Arnaldo, Borghert, Gustavo, Amarante.
Gols: Edward Calvert (1), Arnaldo (4), James Calvert (57), Píndaro (70), Barthô (72).


Referências consultadas:
ASSAF, Roberto e MARTINS, Clóvis. FLA X FLU: o jogo do século – Rio de Janeiro: Letras e Expressões, 1999.
RODRIGUES, Nelson e FILHO Mario. FLA-FLU… e as multidões despertaram. (org. Oscar Maron Filho e Renato Ferreira. Rio de Janeiro: Ed. Europa, 1987.


http://historiadoesporte.wordpress.com/2010/09/15/origens-dos-classicos-iii-o-primeiro-fla-flu/
          

Humildade pra ser campeão. Fla-Flu de 1969.


Ilustração: Flavio Pessoa. Ano: 2009. 
                                                   

"Amigos, a humildade acaba aqui.  Desde ontem o Fluminense é o campeão da cidade. No maior Fla-Flu de todos os tempos, o tricolor conquistou a sua mais bela vitória. e foi também o grande dia do Estádio Mário filho" Nelson Rodrigues assim começou a crônica sobre a grande final de 1969. E ainda eternizou frases fenomenais sobre este clássico dos clássicos. 
"Daqui a duzentos anos a cidade dirá mordida de nostalgia: _ 'Aquele Fla-Flu'. Ah, quem não esteve ontem no Estádio Mário Filho não viveu.(...) Ninguém conquista um título num único dia, numa única tarde. Não. Um título é todo sangue, todo suor e todo lágrimas de um campeonato inteiro. Acreditem: O Fluminense começou a ser campeão muito antes. Sim, quando saiu do caos para a liderança. 'Do caos para liderança', repito, foi a nossa viagem maravilhosa.Lembro-me do primeiro domingo em que ficamos sozinhos na ponta. As esquinas e os botecos faziam a piada cruel: 'líder por uma semana'. Daí pra frente o Fluminense era sempre o líder por uma semana.' 



Ilustração: Flavio Pessoa. Ano: 2009. 


E acabou sendo o líder inclusive quando não havia mais semanas pela frente. A crônica de Nelson exprime uma trajetória recorrente entre as campanhas dos títulos do Fluminense. Volta e meia, não nos dão crédito, dão-nos por mortos. E a equipe, então, é tomada de uma sensação de superação, que desafia matemáticos, analistas táticos, ou, como diria Nelson, "idiotas da objetividade". 
Quem conhece a história pode fazer o teste. É só ler a crônica de Nelson do Globo, do dia 16 de junho de 1969, uma de suas mais conhecidas. Tente encaixá-la em outras ocasiões e perceberão que ela cabe como uma luva até começar a entrar em detalhes sobre o jogo do dia anterior. O canal 100 usou parte d crônica na decisão de 95, na final contra nosso velho freguês de decisões.    



                                         
Foto clássica de Nelson, torcendo no maracanã. 


Roberto Assaf e Clóvis Martins trazem mais informações sobre este grande jogo, que atraiu 171.599 pagantes no dia 15 de junho de 1969, provavelmente o segundo maior público entre dois clubes na história (o primeiro foi outro Fla-Flu, em 1963, também decisivo, mas com desfecho favorável aos rivais, quando um empate em 0x0 levou a taça pra Gávea). 
O Fluminense mantinha uma distância de 3 pontos na tabela e uma vitória rubro-negra levaria a decisão para a última rodada. Empate garantia o troféu nas Laranjeiras. Sempre à frente do placar, fizemos 1x0, aos 9.  neste momento, o goleiro rubro-negro foi reclamar de impedimento no gol tricolor. Correu atrás do juiz para reclamar veementemente e levar cartão vermelho. Eles acabaram empatando aos 35 do primeiro tempo. Fizemos 2x1 aos 38, mas eles empataram novamente, aos 16 da segunda etapa. Jogo tenso. O Flamengo, precisando da vitória vinha pra cima, quando nosso goleador, meu xará Flavio, aos 39, marcou aquele que seria o gol da vitória, "da doce e santa vitória. E rubro-negro não empatou mais. Nunca mais". E Nelson, então, finaliza: 


Cláudio Garcia devolve a bola para as redes, comemorando o gol de Flávio, o 3º do Fluminense no jogo. 

"Passamos toda a jornada com um passarinho em cada ombro e as duras e feias sandálias nos pés. Mas o Fluminense é o campeão. Erguendo-me das cinzas da humildade, anuncio: 'Vamos tratar do bi."
Se o bi acabou não vindo, veio o primeiro campeonato brasileiro no ano seguinte. Mas o importante é que soubemos manter a humildade até o fim. Até ser campeão!   

       
Súmula:
Fluminense 3x2 Flamengo, 15 de junho de 1969
Local: Maracanã.  
Juiz: Armando Marques.
Público: 171.599 pagantes
Cartões: Dominguez (vermelho) 
Fluminense: Félix, Oliveira, Galhardo, Assis, Marco Antônio, Lulinha (Samarone), Denílson, Wilton, Flávio, Cláudio, Lula (Gilson Nunes). Técnico: Telê Santana.
Flamengo: Dominguez, Murilo, Onça, Guilherme, Paulo Henrique, Liminha, Rodrigues Neto, Doval, Fio, Dionísioo, Arilson (Sidnei). Técnico: Tim. 
Gols    


CANAL 100, com a crônica de Nelson, na íntegra, narrada por Paulo César Peréio: 
http://www.youtube.com/watch?v=h626KkrSh4Q


Nas fotos, Samarone, Flávio e Telê Santana, jovem técnico estreando com título no tricolor.  

Manchete do Jornal A Última Hora, do dia 16 de junho de 1969. 



Tricolores comemorando o título. Notem torcedores rubro-negros de costas, na parte debaixo da arquibancada,  Eram outros tempos. 

quinta-feira, 5 de julho de 2012

No primeiro Fla-Flu decisivo, até o Presidente da República virou figurante.

 Ilustração: Flavio Pessoa, ano de 2009.

A primeira grande decisão entre Flamengo e Fluminense ganhou preciosos relatos de Nelson Rodrigues e Mário Filho. Evidentemente, um e outro escreveram suas memórias muitos anos depois da peleja. Basta dizer que Nelson tinha apenas sete anos na ocasião desta grande final. Mário Filho, um pouco mais velho, tinha onze anos. Às vésperas do Natal de 1919, no dia 21 de dezembro, o estádio do Fluminense recebia um público de cerca de 30 mil pessoas. Entre eles, na Tribuna de honra, figurava sua excelência, o então Presidente da República, Epitácio Pessoa.
Curiosamente, Nelson situa a partida no campo do Flamengo, na época ainda na Rua Payssadu, no bairro do Flamengo. Já Mário Filho, bem como Roberto Assaf e Clóvis Martins, no livro "Fla-Flu, o jogo so século", situam o campo tricolor da Álvaro Chaves como o grande palco desta histórica partida. O mesmíssimo estádio em que a seleção brasileira conquistara naquele mesmo ano, o seu primeiro título, o sul-americano de 1919. O Fluminense jogava pelo empate para consagrar o tri-campeonato. Mário Filho e Nelson explicam que uma vitória bastava para que o Flamengo se sagrasse campeão. Já a dupla de jornalistas Roberto Assaf e Clóvis Martins afirmam que para conseguir o título, o rubro-negro precvisava de uma tarefa hercúlea: tinha que vencer aquela partida, a seguinte contra o Bangu e ainda torcer por derrota do Flu contra o América, na última rodada, para poder provocar um jogo extra. No acervo online do JB, infelizmente, não há disponíveis as edições de 1919 daqueles dias. Fico devendo a informação exata, missão da próxima visita à Biblioteca Nacional.

Preliminares.
"O Estádio do Fluminense estava transbordando. Havia gente pendurada nos mastros das bandeiras." Mário Filho escreve que o Flamengo nunca tivera tanta certeza da vitória. O Fluminense convidara seu ilustre vizinho, o Presidente Epitácio Pessoa, que não comparecia ao estádio desde o torneio sul-americano, e assim Arnaldo Guinle preparou o estádio como se fosse para as festividades do torneio internacional. Banda de fuzileiros navais, bandeiras em todos os mastros. Era uma grande ocasião. Na chegada de Epitácio, ainda antes de terminar a preliminar, o juiz suspendia o jogo e a banda de fuzileiros entoava o hino nacional para recepcionar o Presidente.
"E, às duas horas, (...) mandaram fechar os portões.

Os milages de Marcos Carneiro de Mendonça.
Numa final tensa, eqilibrada, estudada, lances polêmicos vão surgindo. Num gol de Zezé a favor do tricolor,anulado pelo sr. juiz,  alguém lembrou da ilustre presença: "É um escândalo fazer uma coisa dessas nas barbas do Presidente da República". Quando em seguida, o mesmo juiz apita uma penalidade máxima a favor do Flamengo, ouve-se no meio da multidão, um berro que Mário Filho diz ter sido ouvido de lado a lado do Estádio:
 _ "Respeite ao menos o Dr. Epitácio Pessoa, seu juiz!"
Pronto. Passado o momento de comemorações e desabafos, Japonês do Flamengo ajeita a pelota para a cobrança. Ali, naquele segundo, todas as atenções estão voltadas para o pênalti a ser cobrado, e sobretudo, como observa Nelson Rodrigues, para o goleiro. Até mesmo a eminente figura do Presidente da República passa a ser só mais um entre os 30 mil figurantes ali presentes. "É o chefe da nação, mas o pênalti fez o esatadista um pobre diabo."
Jamais ninguém foi tão olhado como goleiro Marcos de Mendonça, no momento em que japonês dispara e Marcos espalma. Na sobra rubro-negra, nova bomba à queima-roupa, obrigando Marcos à nova defesa, "num reflexo prodigioso", espalmando novamente, para receber um terceiro tiro ainda mais fulminante do que os outros dois. "Desta vez, ele se agarra e abraça a bola como a um fado.Três defesas rigorosamente impossíveis. E ninguém percebeu porque ninguém enxerga o óbvio, que estava, ali, o sobrenatural de Almeida." Mário Filho fez comentário semelhante: " A multidão ficou parada, sem compreender logo, tal qual um cômicode cinema que só percebe, minutos depois, a graça de uma anedota. (...) A Bola estava longe quando a torcida despertou, prorrompendo em aplausos". A partir daí, o Flumiense passaria a tomar conta do jogo. Machado abririria o placar ainda na primeira etapa.  

Mário Filho fala em estouros de canhões em cima do morro que, a partir do segundo gol, este já no segundo tempo, saldavam a vitória antecipada. O presidente estranha a antecipação, quando quis saber de Arnaldo Guinle o motivo da salva e das palmas compassadas.
"É que a torcdia do Fluminense já está contando com a vitória". " 'Mas não falta muito pro jogo acabar?' 'Falta, excelência.' Faltasse ou não faltasse o Fluminense adquirira a certeza da conquista.
 Veio o terceiro gol, e o quarto. Ouvem-se, então, clarins, e soltam-se serpentinas. Os canhões pareciam que não iam nunca mais parar com os tiros.

Curiosidades
 . Personagens 


Marcos Carneiro de Mendonça

Dois importantes personagens deste primeiro Fla-Flu decisivo da história se destacaram em suas trajetórias como grandes ídolos do clube que, não, por acaso, eram ícones do perfil elitista do clube. Um deles, o célebre Marcos Carneiro de Mendonça, que muito ajduou Mário Filho com seu material de arquivo sobre o seu tempo de jogador, que serviram de documentos para "O negro no futebol brasileiro". Marcos Carneiro, ou Marcos de Mendoça, também conhecido por Fitinha Roxa, que usava amarrada à cintura, foi o primeiro goleiro da seleção brasileira, e o primeiro campeão no primeiro título da seleção. Foi goleiro titular do Flumiense entre 1914 e 1922. Era ídolo e galã cobiçado pelas jovens torcedoras tricolores. Casou com uma delas, Anna Amélia, que lhe escreveu um poema. Da união do casal, nasceu a famosa e "temida" crítica de teatro Bárbara Heliodora. Além dos recortes de jornal que ajudaram a compôr um dos livros mais conhecidos na trajetória do futebol brasileiro, Marcos era historiador (segundo o wikipedia), escritor e colecionador de arte também. Conquistou o tri-campeonato de 17, 18 e 19.


 
Professor Harry Welfare

O professor inglês mr. Harry Welfare, vindo diretamente da Inglaterra para lecionar geografia e matemática no Colégio Anglo-Americano, já havia jogado pelo Liverpool. Ainda que amador, mr. Welfare havia jogado na liga de profissionais. Teria, inclusive, segundo relato de Mário Filho, em outra crônica dedicada ao professor,  tendo jogado contra Irlanda, Bélgica, Holanda. Máquina de fazer gols, estufou as redes adversárias 163 vezes em 166 jogos pelo Fluminense. Foi também o maior goleador em clássicos vovô, com 17 gols, superando Waldo e Heleno de Freitas, ambos com 16. Conquistou o tri-campeonato pelo Fluminense, além do torneio início de 1924.  

. Ficha Técnica:
Fluminense 4 x 0 Flamengo - 21 de dezembro de 1919. Campeonato carioca.
Local: Estádio das Laranjeiras
Juiz: Eduardo Magalhães.
Flu: Marcos, Vidal, Otelo, Osvaldo, Fortes, Mano, Zezé, Welfare, Machado, Bacchi. Técnico: Ramon Platero.
Fla: Laport, Píndaro, Telefone, Japonês, Sisson, Dino, Carregal, Candiota, Pereira Lima, Sidney Pullen, Junqueira.
Gols: Machado, Welfare, Bacchi, Machado.  

Fontes:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Henry_Welfare
Assaf, Roberto e Martins, Clóvis. Fla-Flu, o jogo do século. Rio de Janeiro, Letras e Expressões, 1999. 
FILHO, Mário. O Fla-Flu da Lagoa. in: MARON FILHO, Oscar e FERREIRA, Renato (org.). Fla-Flu...e as multidões despertaram! Rio de Janeiro: Ed. Europa, 1987, p. 78-80.



 
           

terça-feira, 3 de julho de 2012

Bola na Lagoa- o dia em que vencemos o futebol e o remo do Flamengo. .

                                                      Ilustração: Flavio Pessoa, 2009.   

Em vista do centenário deste que é os mais místico e celebrado clássico do futebol brasileiro, se não, mundial, começamos aqui a publicar alguns posts relembrando algumas históricas decisões entre os "irmãos Karamazov" do futebol. Fla-Flu tem história, e evidente que num blog tricolor, vamos privilegiar as decisões que nos foram favoráveis, o que torna essa tarefa mais trabalhosa. Foram oito os grandes jogos decisivos, cujo resultado garantiria mais um troféu na nossa sala-museu que hoje inaugura. Se algum rubro-negro resolver fazer o mesmo exercício investigando as nossas derrotas, terá muito mais facilidade e levará menos tempo. Não passam de três, nesses 100 anos, as ocasiões em que perdemos uma decisão de um título expressivo para os nossos honrosos adversários. Devemos dizer que eles tem a grandeza de admitir essa freguesia nas horas decisivas, nos prestando homenagem em seu prórpio hino: "(...) e nos Fla-Flus é o ai, Jesus!"  Sábio Lamartine.
Provocações à parte, vamos ao episódio da Gávea. Flamengo e Fluminense decidiram o campeonato de 1941 no estádio rubro-negro, colado à Lagoa Rodrigo de Freitas, que acabou se tornando protagonista dessa nossa história. O Flu tinha a vantagem do empate para tentar o bi-campeonato. E quem nos ajuda a contar essa história é aquele que na minha modesta opinião é o mais ilustre torcedor rubro-negro de todos os tempos: Mário Filho, que por coincidência é irmão do igualmente mais ilustre  torcedor tricolor da história ( creio que aqui encontrarei menor controvérsia): Nelson Rodrigues.  Na crônnica sobre esta inesquecível peleja, Mário assume que não apenas o Fla-Flu era o clássico que ele mais gostava (como todos já podíamos imaginar), como também admite sua preferência por esse Fla-Flu da Lagoa. Curiosamente, ele aponta um clássico vencido pelo tricolor e aí está uma pequena mostra da grandeza deste grande rubro-negro que foi Mário Filho.Também devemos lembrar que Mário nos deixou antes de poder testemunhar todos os grandes confrontos de 66 pra cá. E a primeira peculiariedade que ele destaca no jogo diz muito sobre o caráter inusitado deste clássico:
" E o curioso é que desse match a gente só se recorda dos 6 minutos finais. Os gols todos já estavam feitos: dois a dois. Pois foi como se o  Fla-Flu começasse ali e durasse aopenas seis minutos, que não foram seis, que duraram a eternidade."
Mas vamos situar melhor o grau de dramaticidade desta partida. Flamengo e Fluminense vinham fzendo um  jogo equilibrado até que Pedro Amorim abriu o placar para o tricolor. Como o Flamengo sentiu o golpe, o Flu fez o segundo. Com dois a zero e a vantagem do empate, tudo isso na casa do adversário, o Flu recuou. O Flamengo diminuiu a vantagem já no segundo tempo e chegou ao empate quando, no relógio ou na lembrança de Mário Filho, faltavam seis minutos para se encerrar a partida (outros apontam que o gol de empate teria sido aos 40 ou 41 minutos).  Antes de retornar à Mário Filho, que conta o resto da história, anunciemos então, a entrada em cena da nossa querida Lagoa que batizou a decisão daquele ano.
" O Flamengo atacava, o  Flumienense jogava a bola na Lagoa. não se tratava do recurso da bola fora. Bola fora não diantava ao Fluimiense. Noutro campo, a história desse Fla-Flu seria diferente. Bola fora  volta lgo. na Lagoa, demorava. E o Flamengo  E o Flamengo jogou na água guarnições inteiras de remo para apanhar a bola na Lagoa. Parecia que essas guarnições disputavam um campeonato de remo. Apanhavam a bola mandavam de novo para o campo e ficavam nágua, os remos suspensos, os músculos retesados, prontos para quarenta remadas por minuto. Que outra bola havia de vir, e rápida. Enquanto o Fluminense pudesse jogar bolas na Lagoa não faria outra coisa."


Foto do time campeão: Em primeiro plano, Batatais. E, em seguida: Renganeschi, Pedro Amorim, Carreiro, Tim, Machado, Malazzo, Romeu Pelliciari, Russo, Brant, Afonsinho, e o técnico Ondino Viera.


"Era ainda no tempo do cronometrista. O juiz não mandava no tempo, quem mandava era o cronometrista. A bola caía na Lagoa. O cronometrista travava o cronômetro. E o tempo parava. O Flamengo queria que o tempo paraesse, o Fluminense que corresse.
O Flamengo mandou buscar todas as bolas que tinham. Eram bolas de treino, bolas pesadas, duras, enchidas ás pressas, estourando de ar. (...) Lembro-me que Batatais, uma vez, fez cera escolhendo uma entre as muitas bolas do Flamengo.Apertava uma, nõ servia, batia com outra no chão, não servia, como que pesava outra numa mão estendia feito prato de balança, não servia. Batatais escolhia uma bola, ajeitava para Raganeschi, Raganeschi enchia o pé, bola para Lagoa. 
(...)
Era o que ia dar o nome àquele Fla-Flu. Primeiro se disse que fora o 'Fla-Flu de bola na Lagoa'. Depois se sintetizou: 'Fla-Flu da Lagoa'. E dito 'Fla-Flu' e dita 'Lagoa', Já se sabia de que Fla-Flu se tratava."        


   Acho que vale a pena ressaltar dois detalhes no relato de Mário Filho. O primeiro está no fato do Flamengo colocar equipes do remo para ajudar uma conquista no futebol, promovendo uma força conjunta enquanto clube.  no início do século, isso seria impensável. O remo e a regata ocupavam uma posição "hierárquica" superior ao futebol, no rol da  preferência popular entre modalidades esportivas, e o crescimento do interesse da cidade pelo fuetbol certamente foi causa de desconfianças, "rivalidades", atritos e polêmicas. Segundo relatos do próprio Mário Filho, o Clube de Regatas do Flamengo teria aceitado a inclusão do futebol mais pra ver no que ia dar, do que por acreditar no potencial daquele novo esporte bretão. Se isso é mesmo verdade, o episódio, então, marca uma período histórico de valores já bastante mudados. Nos anos 40, o futebol já gozava de ampla popularidade e se não atraía ainda uma multidão de Maracanã é porque este ainda estava pra ser construído. Com a contribuição do próprio Mário Filho,aliás, mas esta é outra história. Outro detalhe é que, assim sendo, num episódio inusitado, dais quais não conheço precendentes na história do futebol, o Fluminense acabou vencendo o Flamengo do remo e do futebol ao mesmo tempo.

Ficha técnica: Flamengo 2 x 2 Fluminense.
Última rodada do Campeonato Carioca de 1941.
Data: 23/11/1941.
Local: Estádio da Gávea.
Flamengo: Yustrich; Domingos da Guia e Newton; Biguá, Volante e Jaime; Sá, Zizinho, Pirillo, Reuben e Vevé. Técnico: Flávio Costa.
Fluminense: Batatais; Renganeschi e Machado; Malazzo, Brant e Afonsinho; Pedro Amorim, Romeu, Russo, Tim e Carreiro. Técnico: Ondino Viera.
Gols: Pedro Amorim (20'), Russo (26') e Pirillo (36') no primeiro tempo; Pirillo (40') no segundo tempo.
Árbitro: José Ferreira Lemos, o "Juca da Praia".
Expulsão: Carreiro.
Público: 15.312 pagantes.
Renda: (réis) 115.943$300.
Fontes: 
FILHO, Mário. O Fla-Flu da Lagoa. in: MARON FILHO, Oscar e FERREIRA, Renato (org.). Fla-Flu...e as multidões despertaram! Rio de Janeiro: Ed. Europa, 1987, p. 78-80.

http://jornalheiros.blogspot.com.br/2009/10/recordar-e-viver-aqueles-quatro-minutos.html